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Passados 44 anos do 25 de Abril, será que aceitamos as ideias dos outros, sem logo os categorizar negativamente quando não coincidem com as nossas? Ou será que a democracia por aqui é praticada nos gestos de livremente dizer e votar e não compreende a convicção generalizada de que viver em liberdade também consiste em aceitar que é no debate civilizado de convicções diferentes e conflituantes que se cumpre a vida diversa das sociedades democráticas?
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Fui no outro dia a uma farmácia à noite. Ao entrar e aproximar-me do balcão, senti que estava a ser olhado. Era um cão com um ar sério, direi quase triste, sentado junto às pernas dos donos, que conversavam em modo animado com o farmacêutico sobre um assunto que não captei. A dada altura pareceu-me que o assunto nada tinha a ver com medicamentos ou com saúde. Eles falavam, falavam de algo exterior à farmácia, gesticulavam, apontavam lá para fora. Mais ou menos assim. Os senhores a discutir o aprofundamento da Zona Euro. Eu e um cão, espreitando-nos, curiosos, um pouco desconfiados, à espera de aviar as receitas.
Durante uns dois, três anos, algumas senhoras aqui do bairro frequentaram a mercearia aqui do canto, onde trabalhavam uns belos rapazes indianos do Punjab. Era vê-las a demorarem-se no espaço, entre repolhos e mandarinas, entre um ou outro mimo feito à sua aparência, entre uma ou outra sugestão de fruta e de vegetais. Um dia, os rapazes foram-se embora. Emigraram para um país que lhes dê melhores condições para viver. As senhoras ficaram desiludidas. Foram abandonadas. Traídas, até. É por isso que os indianos que hoje exploram o espaço têm-no vazio, com pouquíssimas visitas. Eles não sabem a história que os antecedeu. Eles não sabem que as senhoras ainda estão magoadas e que tão cedo não se vão deixar novamente enamorar.
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